Avaliação: o elétrico Nissan Leaf na cidade, na estrada e no cotidiano. Vale a pena?

postado em: Autossustentabilidade | 0

Nesse post, transcrevemos a matéria feita pelo jornalista Flávio Silveira da Motor Show que testou o Nissan Leaf e colocou suas opiniões pessoais e conclusões.

 

O carro elétrico mais vendido do mundo chegou ao Brasil, mas você não deve andar o vendo muito pelas ruas. Afinal, vendido por R$ 195 mil, o Nissan Leaf atenderá a um nicho de mercado específico. Porque se 80% das pessoas dizem em pesquisas que fariam algo diferente para mudar o mundo, ou salvar o planeta, quase nenhuma quer pagar caro por isso. Lançado ainda em 2010, o modelo chega aqui só nove anos depois, na segunda geração. De fora, exceto a grade azul aparentemente mal ventilada, não chama a atenção.

Já quando você entra na cabine do Nissan Leaf, parece até piada: você está em um carro “do futuro”, aperta o botão de partida e luzes no painel se acendem, sem ruído. Procura o freio de mão e… não acha nada, alavanca ou botão. Imagina que é tudo inteligente e automático, acelera, o carro até força, mas não sai… O freio é por pedal, como em picapes e carros americanos.

Ao volante
O espaço do Nissan Leaf equivale ao de um hatch médio espaçoso, como o antigo Tiida. Ao me acomodar ao volante, mais decepções: não há ajuste de profundidade do volante o acabamento é simples – e olha que há banco elétrico, monitor de ponto cego, ACC, alerta de mudança de faixa, câmera 360o, etc. Porém, o que mais chama a atenção é ser tudo tão normal, comum – diferente de elétricos exóticos como o BMW i3. Há pequenas diferenças, como o seletor de marcha tipo joystick, mas ainda é meio “antigo”.

Engato a ré para sair da vaga e um “pi pi pi” alerta os pedestres desavisados. Saio acelerando, e seu zunido é bem mais alto do que em outros elétricos – e até gostosinho, pois dá uma sensação boa de movimento e aceleração. Nas ruas do bairro, nesse quase total silêncio, um pedreiro não se atenta com a minha aproximação e dá um passo para trás, se jogando quase na frente do carro.

A agilidade do Nissan Leaf é impressionante, mesmo sendo um elétrico com “só” 149 cv – mas torque de 32,6 kgfm entregue imediatamente, como em todo elétrico. Suficiente para 0-100 km/h em 7s9, e retomadas e acelerações empolgantes. Há força de sobra: mesmo a 50 km/h, se você pisar fundo ele destraciona as rodas dianteiras. Dirigindo assim, sem dó, da forma mais similar a um carro comum (e ainda assim diferente), fiz médias de 4,5 a 5 km/kWh – mais ou menos metade da melhor, 9 km/kWh (cada kWh custa cerca de R$ 0,50). Mas, como nos híbridos, há diferentes modos de guiar um elétrico.

Com um pé só
Já a melhor média de consumo veio no modo Eco, que já deixa bem mais mais claro que o Nissan Leaf é elétrico. Aumenta o “freio motor” – no caso, a recuperação de energia, tarefa do motor/gerador – e deixa o Leaf meio “amarradinho”. É suficiente para em muitas situações guiar com um pedal só: você tira o pé e deixa o carro perder velocidade até parar. Uma característica é destacada pela marca, que fala no “exclusivo” E-Pedal – que é um modo mais forte de regeneração (não muito diferente de outros elétricos). É para guiar de fato usando só um pedal, reduzindo em até 80% o uso dos freios.

A primeira impressão é legal, mas você demora a criar coragem para usá-lo. É preciso dosar bem o acelerador, pois você alivia o pé e ele freia forte (e acende a luz de freio para ninguém bater atrás). Eu, pelo menos, depois de um tempo cansei de dirigir assim, “amarrado”, parece que com freio de mão puxado, ou pessoas que dirigem o tempo inteiro com o pé no freio. E, há, ainda, o modo B (de brake/freio) do câmbio, usado principalmente em descidas ou reduções de velocidade.

No Nissan Leaf, Para descobrir a melhor combinação entre Eco, modo B e E-pedal – e também a melhor situação para cada um deles – leva um tempo. E, qualquer que seja ela, frenagens súbitas quase sempre dão sustos. É melhor não andar grudado no carro da frente, porque, como acontece em muitos dos híbridos, a transição da “recuperação de energia” (o motor freando o carro e sendo usado como gerador) para a frenagem de verdade (discos de freio) não é sempre tão clara ou imediata.

Na estrada
O Nissan Leaf é um carro principalmente urbano, mas chega à máxima de 144 km/h e também encara eventualmente uma estrada. Pode ter centro de gravidade baixo por causa das baterias sob o assoalho, mas é macio (confortável na cidade) e tem tração dianteira, então não abuse nas curvas. O chassi não parece bem dimensionado para tanto torque e o modo como é entregue. Na estrada a 100 km/h, não fez muito mais que 6,5 km/kWh.

Depois de algum tempo na estrada, a bateria está com 63% da carga e ele me diz que ainda posso rodar mais 156 quilômetros. Ele mantém bem a velocidade e retoma facilmente em ultrapassagens, e você só ouve mesmo o barulho do vento nos retrovisores e dos pneus no asfalto. Mas em alta velocidade as distâncias passam rápido, e de repente eu tinha só 50% da bateria, suficiente para andar mais 120 km. Na tela central, o carro mostra que, se desligar o ar-condicionado, posso rodar 8 km além do calculado.

Chego de volta a São Paulo (ufa!) ainda com 43% de bateria e 109 quilômetros de autonomia. No semáforo, uma moto Harley-Davidson para ao meu lado e a porta do Leaf até treme com o barulho de seu motor. Vem a luz verde e ele acelera, quase ensurdecendo a todos. Eu o acompanho, sem esforço e sem barulho nenhum.

No modo Eco, vou devolver o Nissan Leaf. Trânsito livre, da Pompeia ao Butantã faço média de 8 km/kWh. Ainda há 33% de bateria, ou 88 km de autonomia. Não tinha onde carregá-lo, mas no meu uso normal só teria que fazê-lo uma vez por semana – em tomada comum são 20 a 40 horas, com o carregador de parede (wall box, 32A), 6 a 8 horas. Dá para rodar até 240 km/dia, mais do que o necessário. E eu até arriscaria visitas ao meu sogro em Campinas.

O preço do pioneirismo
Pelo preço atual, o Nissan Leaf é uma compra que pela diversão, pela imagem eco-friendly, pela colaboração na redução do ruído e da poluição, pela isenção do rodízio… mas não como negócio. Pelo preço dele, dá para comprar um SUV híbrido como o Toyota RAV4 para viajar e um compacto econômico para o cotidiano. Enquanto isso não mudar, não há muito como justificar a sua compra.

Fonte: Motor Show